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Homem na Estrada

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Um homem na estrada recomeça sua vida.

Sua finalidade: a sua liberdade.

Que foi perdida, subtraída;

e quer provar a si mesmo

que realmente mudou,

que se recuperou e quer

viver em paz, não olhar

para trás, dizer ao crime: nunca mais!

Pois sua infância não foi

um mar de rosas, não.

Na Febem, lembranças dolorosas, então.

Sim, ganhar dinheiro, ficar rico, enfim.

Muitos morreram sim,

sonhando alto assim,

me digam quem é feliz,

quem não se desespera, vendo

nascer seu filho no berço da miséria.

Um lugar onde só tinham como atração,

o bar e o candomblé

pra se tomar a benção.

Esse é o palco da história

que por mim será contada.

...um homem na estrada.

Equilibrado num barranco um

cômodo mal acabado e sujo,

porém, seu único lar, seu bem e seu

refúgio.

Um cheiro horrível de esgoto no quintal,

por cima ou por baixo,

se chover será fatal.

Um pedaço do inferno,

aqui é onde eu estou.

Até o IBGE passou aqui

e nunca mais voltou.

Numerou os barracos, fez

uma pá de perguntas.

Logo depois esqueceram, filha da puta!

Acharam uma mina morta e estuprada,

deviam estar com muita raiva.

"Mano, quanta paulada!".

Estava irreconhecível,

o rosto desfigurado.

Deu meia noite e o

corpo ainda estava lá,

coberto com lençol,

ressecado pelo sol, jogado.

O IML estava só dez horas atrasado.

Sim, ganhar dinheiro, ficar rico, enfim,

quero que meu filho nem se lembre daqui,

tenha uma vida segura.

Não quero que ele cresça

com um "oitão" na cintura

e uma "PT" na cabeça.

E o resto da madrugada

sem dormir, ele pensa

o que fazer para sair dessa situação.

Desempregado então.

Com má reputação.

Viveu na detenção.

Ninguém confia não.

...e a vida desse homem

para sempre foi danificada.

Um homem na estrada...

Um homem na estrada..

Amanhece mais um dia e

tudo é exatamente igual.

Calor insuportável, 28 graus.

Faltou água, já é rotina, monotonia,

não tem prazo pra voltar, hã!

já fazem cinco dias.

São dez horas, a rua está agitada,

uma ambulância foi chamada

com extrema urgência.

Loucura, violência exagerado.

Estourou a própria mãe,

estava embriagado.

Mas bem antes da ressaca

ele foi julgado.

Arrastado pela rua o pobre do elemento,

o inevitável linchamento, imaginem só!

Ele ficou bem feio, não tiveram dó.

Os ricos fazem campanha contra as drogas

e falam sobre o poder destrutivo dela.

Por outro lado promovem

e ganham muito dinheiro

com o álcool que é vendido na favela.

Empapuçado ele sai, vai dar um rolê.

Não acredita no que vê,

não daquela maneira,

crianças, gatos, cachorros

disputam palmo a palmo seu café

da manhã na lateral da feira,

Molecada sem futuro, eu já consigo

ver, só vão na escola pra comer,

Apenas nada mais, como é que vão

aprender sem incentivo de alguém,

sem orgulho e sem respeito,

sem saúde e sem paz.

Um mano meu tava ganhando um dinheiro,

tinha comprado um carro,

até rolex tinha!

Foi fuzilado a queima roupa no colégio,

abastecendo a playboyzada de farinha,

Ficou famoso, virou notícia,

rendeu dinheiro aos jornais,

ham!, cartaz à policia

Vinte anos de idade, alcançou

os primeiros lugares...

super-star do notícias populares!

Uma semana depois chegou o crack,

gente rica por trás, diretoria.

Aqui, periferia, miséria de sobra.

Um salário por dia

garante a mão-de-obra.

A clientela tem grana e compra bem,

tudo em casa, costa quente de sócio.

A playboyzada muito louca até os ossos!

Vender droga por aqui, grande negócio.

Sim, ganhar dinheiro ficar rico enfim,

Quero um futuro melhor,

não quero morrer assim,

num necrotério qualquer, um

indigente, sem nome e sem nada,

o homem na estrada.

Assaltos na redondeza

levantaram suspeitas,

logo acusaram favela para variar,

E o boato que corre é que esse

homem está, com o seu nome

lá na lista dos suspeitos,

pregada na parede do bar.

A noite chega e o clima estranho no ar,

e ele sem desconfiar de nada,

vai dormir tranqüilamente,

mas na calada caguentaram

seus antecedentes,

como se fosse uma doença incurável,

no seu braço a tatuagem, DVC,

uma passagem, 157 na lei...

No seu lado não tem mais ninguém.

A Justiça Criminal é implacável.

Tiram sua liberdade, família e moral.

Mesmo longe do sistema carcerário, te

chamarão para sempre de ex presidiário.

Não confio na polícia, raça do caralho.

Se eles me acham baleado na calçada,

chutam minha cara e cospem em mim é..

eu sangraria até a morte...

Já era, um abraço!.

Por isso a minha

segurança eu mesmo faço.

É madrugada, parece estar tudo normal.

Mas esse homem desperta, pressentindo

o mal, muito cachorro latindo.

Ele acorda ouvindo barulho de

carro e passos no quintal.

A vizinhança está calada e

insegura, premeditando o

final que já conhecem bem.

Na madrugada da favela não

existem leis, talvez a lei do

silêncio, a lei do cão talvez.

Vão invadir o seu barraco, é a polícia!

Vieram pra arregaçar, cheios

de ódio e malícia, filhos da

puta, comedores de carniça!

Já deram minha sentença e eu

nem tava na "treta", não são

poucos e já vieram muito loucos.

Matar na crocodilagem, não vão

perder viagem, quinze caras lá fora,

diversos calibres, e eu apenas

com uma "treze tiros" automática.

Sou eu mesmo e eu, meu

deus e o meu orixá.

No primeiro barulho, eu vou atirar.

Se eles me pegam, meu filho fica

sem ninguém, e o que eles querem:

mais um "pretinho" na febem.

Sim, ganhar dinheiro ficar rico

enfim, a gente sonha a vida inteira

e só acorda no fim, minha verdade

foi outra, não dá mais tempo

pra nada...

Homem na Estrada от Racionais MC's - Тексты & Каверы